domingo, 10 de março de 2013

As estatísticas não mentem

Caro amigo motociclista,

Uma das perguntas mais comuns que escutamos das pessoas em nosso dia-a-dia, ao descobrirem que andamos de moto, é: "nossa, mas você não tem medo de se machucar/morrer/cair?". Na verdade, a resposta é não e sim.

Não, por uma série de razões de cunho completamente irracional, como o puro prazer de andar na moto  (o tal "vento no rosto"), ou questões estritamente racionais, como a praticidade e a agilidade que ganhamos, o fato é que andar de moto tem muitas motivações positivas, que nos levam a sair de casa todo o dia com confiança e certeza de que voltaremos sãos e salvos. É umas sensação de liberdade que não tem igual, isso sem falar na possibilidade das viagens...

Sim, porque se não fosse esse medo, não tomaríamos os cuidados necessários. Repare que você não dirige uma moto, você a pilota. Começa por aí. Para sair você cumpre um ritual (eu, pelo menos, faço isso!), que inclui vestir os equipamentos de segurança, como um bom capacete (você vai economizar com a sua cabeça?), um casaco adequado com as proteções rígidas, luvas, calças compridas e um tênis ou bota, preferencialmente com cano alto. 

Fonte: Google

Mesmo no deslocamento diário para o trabalho não abro mão do trio capacete/casaco/luva. E há que se ter muita força de vontade para vestir esse conjunto no calor do Rio de Janeiro. E já ouvi algumas piadas, pois usava proteção mesmo quando tinha um simples scooter, afinal ele "nem corre tanto". Se quiser, é só experimentar o seguinte teste: pegue carona em um carro, quando estiver entre 60 ou 80 km/h, abra a porta e se jogue no asfalto. Essa experiência deliciosa será similar à sensação de cair do lento scooter...

Na moto não temos a proteção passiva do automóvel, com sua carroceria. Isto é, nossa proteção passiva é próxima a zero. Então temos que quadriplicar o cuidado e a atenção. Se estiver saindo do trabalho ou qualquer lugar com a "cabeça quente", melhor parar em um posto de gasolina, comprar um refrigerante e esperar uns 10 ou 15 minutos, pensando em outras coisas. Moto tem que ser pilotada com concentração, não tem jeito.

Infelizmente, o progresso econômico do nosso país teve algumas consequências negativas. A maior facilidade de acesso ao crédito, os consórcios de valores bastante baixos, permitiu o acesso ao consumo a milhões de pessoas antes alienadas dessa possibilidade. As motocicletas tornaram-se então uma excelente alternativa de meio de transporte diário, pois são baratas, econômicas e práticas. O que deveria ser uma excelente notícia, foi combinado com a falta de fiscalização reinante em nosso país, a falta de educação básica e um processo de habilitação completamente ridículo. Resultado: milhares de motociclistas entrando nas ruas todos os dias, sem o menor preparo.

Cruzamos com cenas assustadoras diariamente. Despreparo, imprudência, agressividade, um coquetel muito perigoso, que leva aos resultados que conhecemos: mortes e acidentes diários envolvendo motociclistas, em uma proporção muito maior do que a dos automóveis. A opção das grandes cidades pelos moto-fretistas (ou motoboys, em bom português), é irreversível, pois o trânsito só piora a cada dia, mas também coloca muitos jovens sem preparo no trânsito, onde muitos vêm a falecer ou sofrer acidentes com sequelas irreversíveis.

O fato é que as estatísticas não mentem. Tudo isso que foi exposto acima só piora a fama da motocicleta como veículo perigoso, o que só nos prejudica. Precisamos nos conscientizar e conscientizarmos quem nos rodeia, além de cobrar das autoridades medidas inteligentes de organização e planejamento de trânsito. Isso sem contar um trabalho forte de educação, a meu ver fundamental para as mudanças que queremos no país.

Fonte: Google

Até quando vamos ver cenas como essa acima? Espero que meus filhos herdem um país mais educado e preparado, capaz de utilizar as motos como elas merecem!

Um abraço e boas estradas!


sexta-feira, 1 de março de 2013

O prazer de viajar de moto

Caro amigo motociclista,

Hoje um colega e amigo motociclista convidou-me a fazer uma viagem de moto até a famosíssima Serra do Rio do Rastro, em SC, junto com outros aventureiros, para curtir suas curvas fantásticas. A despeito de minha impossibilidade de realizar tal jornada neste momento, o convite inspirou-me a finalmente escrever esse post sobre as viagens de moto. Minha esposa outro dia havia perguntado-me como que eu ainda não escrevera sobre esse assunto que me é tão caro...

Esse talvez seja o tema mais unânime quando falamos do mundo das duas rodas: viajar de moto é muito bom! Claro que gostamos de utilizar a moto no dia-a-dia, escapar dos engarrafamentos, pagar menos estacionamento em shoppings e coisas afins. Mas existe também o trânsito, a fumaça dos carros, os motoristas mal-educados, os ônibus, os corredores apertados, os buracos. Então no fundo, bem no fundo mesmo, o que realmente nos embala os sonhos é a possibilidade de pegar uma estrada, linda e perfeita, preferencialmente bem acompanhado, em um dia de clima ameno e sol brilhante.

Fonte: Google

Querendo ou não, a viagem de moto nos remete à aventura, o desafio e, na minha modesta opinião, ao auto-conhecimento. É uma sensação de liberdade fantástica sentir o vento no rosto e apreciar as novas paisagens a cada quilômetro, de uma forma integrada com o ambiente como só a moto pode proporcionar. O silêncio e a concentração limpam a mente e nos permitem jogar fora todo o estresse, fazendo com que a viagem pareça uma verdadeira terapia (e é mesmo!).

Sempre gostei muito de viajar e, graças ao meu pai, conheci várias regiões de nosso país de carro, o que na época era uma espécie de aventura. A viagem de moto povoa meu imaginário desde a adolescência, quando comecei a ler as revistas especializadas da época (Motoshow, Duas Rodas e ficava por aí...). Já naquele tempo alguns loucos (sim, porque somente um louco encarava as estradas dos anos 80 com as motos dos anos 80...) faziam viagens pelo país e pelo mundo, enviando depois suas fotos e narrativas para as revistas. Desbravar os recantos do nosso país em uma moto era um sonho que me encantava. Talvez o ápice da aventura naquela época (e para muitos até hoje) fosse a viagem até Ushuaia, no sul da Argentina. O tal "fin del mundo" era de dificílimo acesso, estradas péssimas, poucos recursos logísticos no caminho, policiais corruptos e um clima complicadíssimo. Mesmo assim, vários motociclistas chegaram lá, com motos bem menos cheias de recursos que as atuais. 

Eu também "viajava" com as reportagens sobre o Paris-Dakar daquela época, com o pessoal passando de motos em paisagens fantásticas, que pareciam coisa de outro mundo. Ok, eu sei que aquilo era uma competição esportiva e aqui estamos falando de viagens, mas muitas vezes me imaginei cruzando aqueles desertos em duas rodas, a sensação plena de desbravar novos mundos. Lá pelos 15 anos, eu e minha "gangue" da Mobylette fazíamos viagens entre a cidade onde morávamos e um longínquo distrito que ficava a 12 km de distância. Não me pergunte como conseguíamos andar na BR com um ciclomotor sem placa...

Para encurtar a história, somente em 2010 realizei meu sonho de fazer uma pequena viagem de moto. Aproveitei um feriado-ponte e coloquei o pé na estrada. Na época eu tinha uma Suzuki DL 650 V-Strom, moto perfeita para viagens. Era uma terça-feira de outubro e na véspera eu lembro de ter preparado a moto (abastecida, calibrada, limpa), separado as roupas certas (capacete, casaco, calça, botas), além de alguns extras para minha segurança, como um reparador automático de pneus. Na noite anterior, todavia, caiu o mundo e choveu como há muito não se via. Cheguei a pensar que a oportunidade estava perdida...

No tal dia, levantei cerca de 6h da manhã e olhei pela janela. Nenhuma nuvem no céu, limpo e claro. Uma brisa fresca e agradável soprava, me chamando para a estrada. Não tive dúvida e parti logo. Foi um trajeto relativamente curto, de aproximadamente 380km, mas muito prazeroso. Lição breve aprendida logo de cara: coloquei apenas uma camiseta por baixo do casaco e logo o frio começou a incomodar. Sorte que eu havia levado mais uma camiseta de manga longa, pois parei em um posto e coloquei por cima da outra, aliviando na hora. É horrível sentir frio na moto, pois você começa a contrair os músculos e logo o corpo inteiro está doendo.

Saí do Rio de Janeiro em direção a Angra dos Reis pela BR-101 (a famosa Rio-Santos), depois subi a estrada para Barra Mansa, passando pelo distrito rioclarense de Lídice, a RJ-155. Esse trecho é realmente fantástico, com curvas maravilhosas em uma estrada de excelente qualidade e pouco movimento. A subida da Serra proporciona paisagens incríveis a cada curva. A única ressalva fica por conta dos túneis históricos, cujo chão ainda é feito de pedras tipo pé-de-moleque, que agravadas pela umidade natural da montanha, transforma o chão em uma espécie de sabão, muito perigoso. Além de tudo, os túneis são bem escuros.

Fonte: arquivo pessoal

Um aspecto interessante de viajar de moto é que, ao contrário de quando andamos na cidade, onde somos os vilões, os motoqueiros, aqueles que quebram os retrovisores dos carros, na estrada existe uma certa admiração e respeito. Nesse dia, era comum parar em um posto de gasolina e pessoas virem conversar, saber para onde eu estava indo, como era a moto, etc... Lembro que um rapaz que estava com toda a família em um carro veio conversar, dizendo que ele fazia parte de um motoclube em SP, que curtia viajar de moto também e acabou dando algumas dicas sobre as estradas.

Fonte: arquivo pessoal

Depois de subir a RJ-155, cheguei a Rodovia Presidente Dutra, onde pude aproveitar suas boas condições para dar algumas esticadas na moto, momentos que só a estrada proporciona. Aquele trecho da Serra das Araras é muito bonito, mas também cansativo, pois as curvas são muito fechadas. É para redobrar a atenção. Voltei ao RJ à tarde, cansado, mas extremamente feliz pela aventura. Embora curta, foi suficiente para experimentar um pouco das delícias de viajar de moto.

E você, qual foi a melhor viagem?

Um abraço e boas estradas!

Fonte: arquivo pessoal